Carga tributária das escolas: aumento constante
A sociedade brasileira foi agraciada, no meio de 2007, com o advento de uma nova abordagem tributária por parte do Governo Federal. Trata-se do Supersimples, ou Simples Nacional, modelo que foi criado em substituição ao Imposto Simples Federal que esteve em vigor de 1996 até junho de 2007.
A troca foi compulsória, o que significa dizer que o modelo anterior do Simples foi extinto e deixou de ser opção para as pequenas empresas. Diante disso, as escolas optantes do Simples se viram diante das alternativas de migrar automaticamente para o Supersimples ou mudar de sistema tributário, passando para o lucro real ou para o presumido.
Expressa assim, de forma sintética, a questão parece simples, como se não trouxesse nenhum complicador para as escolas. Mas isso está longe de ser verdade.
A criação do Supersimples se transformou, para as escolas, em mais um capítulo da longa novela de aumento de sua carga tributária. O Supersimples, criado por uma legislação singelamente chamada de “MP do Bem”, aumenta significativamente o peso dos tributos para as escolas. Imaginem só o que faria uma “MP do Mal”.
Antes de entrar no mérito da análise do impacto do Supersimples, é conveniente lembrar um pouco da evolução da carga tributária das escolas particulares nos últimos 10 anos.
Existem, basicamente, 5 tipos de incidência de imposto em uma escola: sobre a receita, sobre os salários, sobre o Pro-Labore, sobre o lucro e com outras bases de cálculo (como IPTU e IPVA). Vamos descartar esse último grupo, que exigiria uma análise um pouco mais complexa. Para os outros 4 tipos de incidência, torna-se absolutamente matemático mostrar que houve um significativo processo de aumento da carga tributária.
Vamos imaginar, em primeiro lugar, o caso de uma escola não optante pelo Simples. O aumento da carga sobre cada um dos 4 tipos de impostos pode ser descrito conforme abaixo:
– Impostos sobre a receita: há 10 anos, a escolas pagavam 0,65% de Pis e 2% de Cofins; as alterações tributárias elevaram estas incidências para 1,65% e 3%, respectivamente; houve, portanto, um aumento de 2% da receita no volume de impostos.
– Impostos sobre salários: há 10 anos não havia incidência de salário-educação para as escolas particulares. O Governo implantou esta cobrança, contra a qual as escolas se insurgiram, mas acabaram perdendo no Judiciário; o incremento foi de 2,5% sobre a folha. Além disso, para cobrir os gastos provenientes de correções monetárias das contas de FGTS, o Governo criou um imposto equivalente a 0,5% da folha, a ser pago junto com o depósito mensal de FGTS; com a mesma finalidade, acrescentou 10% sobre o saldo de FGTS ao pagamento da multa de 40% no momento da demissão de funcionários. O impacto total desses incrementos foi da ordem de 1,5% da receita para as escolas.
– Impostos sobre Pro-Labore: da mesma forma como no caso do salário-educação, as escolas criaram também uma demanda judicial contra a cobrança implantada pelo Governo de 20% de INSS sobre o Pro-Labore dos sócios. Também nesse caso, as escolas acabaram derrotadas em seu intento. Imaginando que o Pro-Labore represente em média 8% da receita, o impacto deste tributo foi de 1,6% da receita.
– Impostos sobre o lucro: há 12 anos boa parte das escolas estava no sistema de lucro presumido. Isso era facilitado pelo fato de que a legislação específica a respeito usava como presunção de margem de lucro para as escolas 10%. De uma vez só, o Governo elevou esta presunção de lucro para 32%. Isso fez com que quase a totalidade das escolas fosse expulsa do modelo de lucro presumido e tivesse de migrar para o lucro real. A ação do Governo, porém, não parou por aí. As alíquotas de Imposto de Renda e de Contribuição Social eram, respectivamente, de 15% e 8%. O Governo criou um adicional de mais 10% para lucros acima de R$ 240 mil por ano, e passou a Contribuição Social de 8% para 9%. É difícil dimensionar o impacto destas medidas sobre as escolas. As que ficaram no lucro presumido tiveram a carga aumentada em cerca de 10% da receita. As que passaram para o lucro real tiveram, em média, um aumento de 0,5% a 1% da receita em suas cargas tributárias.
Como se pode notar, não foi nada fácil a vida das escolas particulares que não optaram pelo Simples nos últimos anos. A vida dos optantes pelo Simples, porém, também foi igualmente difícil, como veremos.
O Simples, criado em 1996, foi uma idéia fantástica para o grupo de empresas autorizado pela lei a fazer a adesão. O objetivo era propiciar uma redução na carga tributária para as pequenas empresas – o que foi conseguido na ocasião.
Mesmo com a redução momentânea, a vida das escolas no Simples nunca foi tranqüila. Por conta de um artigo da lei que impedia que empresas que prestassem serviços de “professores ou assemelhados” fizessem adesão ao sistema, o Governo passou a contestar o direito das escolas à opção. A batalha no campo jurídico foi dura mas, na grande maioria dos casos, vitoriosa. Já a batalha política ofereceu uma vitória de Pirros. No ano 2000 o Governo editou uma legislação específica para as escolas particulares. Nela, dava fim ao embate, permitindo definitivamente a adesão das escolas. Foram duas as contrapartidas exigidas: a) ficaram de fora as escolas de Ensino Médio, cuja opção foi vedada; b) a alíquota do Simples foi majorada em 50% exclusivamente para as escolas particulares.
Foi, e ainda é, muito difícil entender porque o setor de educação, teoricamente tido como estratégico para o crescimento e fortalecimento do Brasil, foi justamente o escolhido para sofrer o impacto de uma tributação 50% mais alta do que os demais setores. Apesar de, ainda assim, o Simples se mostrar melhor do que os demais sistemas, o impacto para as escolas foi da ordem de 3,5% da receita – uma enormidade em um setor com margens de lucro relativamente baixas.
Agora vem o Supersimples. Seu advento representa um aumento de 2% a 6% da receita na carga tributária das escolas. Este impacto decorreu de 4 fatores: a) as alíquotas foram ligeiramente majoradas em comparação com o Simples antigo; b) a base de cálculo da alíquota do imposto, que era a receita acumulada no ano, passou a ser a receita acumulada sempre nos últimos 12 meses – o que faz com que a alíquota, que era crescente ao longo do ano, passasse a incidir no pico o ano todo; c) eliminação do único setor que ainda era beneficiado pela alíquota original do Simples, que eram as escolas de Educação Infantil; d) inserção do ISS no Simples à base de 5% da receita, independentemente da alíquota municipal anterior; com isso, escolas de cidades com a de São Paulo viram seu ISS aumentar de 2% para 5% – um inacreditável impacto de 3% da receita. Isso tudo, na MP do Bem.
A evolução da carga tributária se mostra, portanto, uma verdadeira epopéia na vida das escolas, cujo capítulo mais recente, e de efeito contundente, foi o advento do Supersimples. A sensação que vivem os mantenedores é a de que não existe, no país, uma discussão séria sobre causa e efeito no momento de legislar sobre impostos. O incremento de carga do Supersimples passou sem que muitos detalhes importantes tivessem sido discutidos. Para as escolas, vão restando poucas opções tributárias verdadeiramente factíveis.
(Imagem: Rosifan19/iStock.com)