Os inimigos ocultos do orçamento
Não é novidade para nenhum gestor de escola que a folha de pagamento representa, de longe, o principal item de custo de uma instituição de ensino. Somando-se salários, encargos e benefícios, o custo com pessoal ultrapassa, na quase totalidade dos casos, metade da receita de uma escola. Há casos em que, por questões internas de desequilíbrio orçamentário, essa relação fica próxima a 70%.
Em artigos anteriores já frisamos não só o grau de importância do controle da folha de pagamento na boa gestão de um orçamento, mas também a sensibilidade que decisões referentes a este tema têm sobre o desempenho econômico-financeiro de curto e de longo prazos. De fato, pequenos incrementos salariais causam significativos impactos nas projeções de prazo mais longo.
Por este motivo, indicamos a necessidade de implantação de uma metodologia de controle contínuo da folha de pagamento. Apesar de ser um item tão sensível, é incrível como ele tem uma tendência de crescimento vegetativo nas escolas, caso não seja feito um rigoroso e contínuo controle fino sobre ela.
Esse crescimento vegetativo da folha representa, na maior parte das escolas, o grande inimigo do orçamento.
No presente artigo trataremos de outros inimigos do orçamento. São itens que, se comparados à folha de pagamento, parecem sem importância, pois seu peso no orçamento é bem menor. Mas não são. É sempre bom lembrar que o setor do ensino básico privado trabalha, em geral, com margens de lucro relativamente estreitas. O bom gerenciamento do orçamento, como um todo, é medida mais do que necessária para garantir o equilíbrio financeiro.
Por este motivo, não basta olhar somente para o grande. Há itens no orçamento que, apesar de bem inferiores à folha, devem merecer atenção, pois podem propiciar desequilíbrios relevantes.
Existem 3 destes itens que se comportam, invariavelmente, como verdadeiros inimigos ocultos do orçamento, quando não é praticada uma política ativa de controle deles: gastos com material, com tarifas públicas e com despesas bancárias. Cada um deles tem esse comportamento por um motivo diferente. Por este motivo, para cada um deles a metodologia de busca da eficácia no controle é diferente.
Os gastos com material apresentam uma tendência natural ao descontrole porque, em boa parte das escolas, não são dotadas verbas pré-definidas para a despesa com este item. As decisões sobre aquisição, neste cenário, acabam sendo tomadas de acordo com o interesse imediato, a criatividade ou a noção de necessidade dos compradores. É interessante notar que mesmo essa noção de “compradores” é bastante tênue. A autonomia para decisão sobre gastos, em especial na área de material pedagógico, costuma ser descentralizada. Conceder à área pedagógica a prerrogativa de gerenciar a aquisição de seu próprio material não contém, em si, um erro. O que subverte esta ação é a falta de dotação e controle de verbas pré-definidas.
O que deve ser aplicado à área de compra de material é, portanto, um sistema de dotação e controle de verba bastante claro, rigoroso e contínuo. Certamente a área mais indicada para definição da compra do material pedagógico é a própria área pedagógica; porém, a otimização deste processo, a garantia das melhores escolhas e a conquista na melhor relação custo x benefício só se dá com a dotação e o controle de verbas. A Corus vem atuando, com bastante sucesso, na implantação deste tipo de sistema nas escolas.
O sucesso da implantação deste sistema é dado, principalmente, pela forma como oficializa a descentralização da gestão das verbas. Os gastos com material podem ser divididos em vários responsáveis, de acordo com as sub-áreas envolvidas, cada qual com seu limite de gastos. Dentro desse limite, cada responsável tem um limitador, por um lado, mas tem também autonomia, por outro. É essa autonomia, casada com o contínuo controle em conjunto com a tesouraria, que leva ao sucesso dessa operação.
O que vale para o material pedagógico vale, também, para os demais materiais, como os de consumo, limpeza e de escritório. Dotar, descentralizar e controlar verbas costuma ser providencial na administração do gasto com material, tornando-o racional e impedindo que se transforme em um pequeno inimigo do orçamento.
Em média, os gastos com material costumam ficar numa faixa de 1,5% a 3,0% da receita de uma escola. Não é pouco dinheiro.
A importância da implantação de controle de verbas fica muito clara no caso do material, mas essa não é a única área em que ela é recomendável. Pode ser expandida para outras verbas variáveis, como manutenção, publicidade e horas-extras.
Outro potencial inimigo do orçamento são as tarifas públicas. Usamos a nomenclatura “tarifas públicas” apenas para facilitar a referência aos gastos com contas de consumo de água, luz e telefone. A rigor, boa parte dessas tarifas não tem mais gestão pública, devido ao processo de privatização das concessionárias. Vamos, porém, deixar esse detalhe técnico de lado e privilegiar a facilidade de entendimento da questão.
Assim como o material, também no caso das tarifas públicas os gastos, em média, costumam ficam entre 1,5% e 3% da receita. E, da mesma forma, se não controlados rigorosamente, tendem a sair do controle.
Periodicamente as escolas fazem campanhas de contenção de gastos dessas tarifas. A periodicidade muda de escola para escola e é dada, normalmente, pela identificação de aumentos injustificáveis de consumo, o que normalmente se dá por desperdícios ou má utilização das ferramentas.
É muito difícil a implantação de uma rotina que garanta o sucesso dessa racionalização
a priori. Nas tarifas públicas, depois de feito o estrago, só resta pagar a conta. Por este motivo, a metodologia de controle é diferente daquela proposta para o caso do material.
As escolas devem adotar uma sistemática contínua de verificação da evolução do consumo de tarifas por natureza. Assim, a conta de água deve ser dimensionada, mensalmente, em metros cúbicos; a de luz, em kWh; só a de telefone pode ser controlada em R$, mesmo.
O acompanhamento constante da evolução do consumo de tarifas públicas garante a identificação, no momento mais imediato possível, de eventuais desvios de rota. Muitas vezes, por exemplo, esses desvios podem se dar por um vazamento de água. Fomos testemunha de casos de escolas que, por não fazer o controle contínuo de consumo, só se aperceberam disso cerca de 6 meses depois. Estavam imaginando, erroneamente, que o aumento na conta se devia a um reajuste de tarifas – que não havia ocorrido. A verificação mensal do consumo de tarifas públicas garante a ação imediata no caso de oscilações relevantes e impede que elas se transformem em um inimigo do orçamento.
No caso da conta de água, cabe ressaltar que a leitura contínua do consumo pode chegar a ser diária, de modo a agilizar a detecção de vazamentos. Há escolas que fazem esse procedimento com sucesso.
No caso do telefone, é interessante lembrar que há alternativas bem econômicas de pacotes com as operadoras. Dependendo do padrão de uso, podem ser geradas economias bem sensíveis.
Por fim, gostaríamos de tratar das despesas bancárias. Não estamos falando de juros, que representam uma outra natureza de gasto e devem ser completamente separados no orçamento e na análise. Entendemos por “despesas bancárias” as tarifas que os bancos cobram pelos serviços que prestam. A mais comum é a tarifa de cobrança, mas ela está longe de ser a única.
Essas despesas representam, em média, 0,5% da receita de uma escola. Apesar de terem um peso mais baixo, elas trazem consigo um fator importante: seu crescimento não costuma vir acompanhado de nenhuma melhoria de qualidade no serviço que a escola presta a seus clientes.
Trata-se de uma despesa quase invisível para o cliente final. Por este motivo, sua administração deve ser feroz, com o único objetivo de minimizar os gastos. Pelo seu valor mais baixo e por estar fora do seu core business, as escolas costumam ser relativamente lenientes com estes gastos. Muitas nem os acompanham e não sabem quanto representam em seus orçamentos. Isso traz um perigo para as instituições, pois as despesas bancárias também têm uma tendência de crescimento vegetativo, se deixadas à sua própria sorte.
São extremamente comuns os casos de cobranças indevidas de tarifas através de débitos em conta-corrente. É uma prática comum nos bancos, e não cabe aqui entrar no mérito sobre se é intencional ou não. O fato que é isso ocorre, e muito.
No mesmo sentido, a revisão unilateral, e para cima, do custo das tarifas de cobrança também é uma prática comum. Depois que os bancos conquistam a simpatia do cliente, passam a “morder” mais nessa tarifa.
Para se precaver contra essa natureza de fatos, é fundamental acompanhar de perto, no mínimo com um relatório mensal, a totalização das tarifas cobradas pelos bancos, independentemente de sua natureza. O cuidado a ser tomado é separar os juros, que, como já dito, representam outro tipo de despesa.
O espírito na negociação com os bancos deve ser o da concorrência, em especial no que se refere à cobrança. Se o seu banco aumentou o valor desta tarifa, esteja certo de que deve haver um outro banco disposto a lhe oferecer este mesmo serviço, com a mesma qualidade, por um valor menor.
Esse é um dos motivos pelos quais vale a pena ter conta em pelo menos dois bancos.
O acompanhamento das despesas bancárias dentro deste espírito impedirá que elas se transformem, também, em inimigas do orçamento.
(Imagem: Sitthiphong/iStock.com)